"Céu baixo, grosso, cinzento
e uma luz vaga pelo ar
chama-me ao gosto de estar
reduzido ao fermento
do que em mim a levedar
é este estranho tormento
de me estar tudo a contento,
em todo o meu pensamento
ser pensar a dormitar.
Mas que há para lá do sonhar?"
(Vergílio Ferreira, in 'Conta-Corrente 1')
"Não haverá razão para viver, nem termo para as nossas misérias, se fôr mister temer tudo quanto seja temível. Neste ponto, põe em acção a tua prudência; mercê da animosidade de espírito, repele inclusive o temor que te acomete de cara descoberta. Pelo menos, combate uma fraqueza com outra: tempera o receio com a esperança. Por certo que possa ser qualquer um dos riscos que tememos, é ainda mais certo que os nossos temores se apaziguam, quando as nossas esperanças nos enganam.Estabelece equilíbrio, pois, entre a esperança e o temor; sempre que houver completa incerteza, inclina a balança em teu favor: crê no que te agrada. Mesmo que o temor reuna maior número de sufrágios, inclina-a sempre para o lado da esperança; deixa de afligir o coração, e figura-te, sem cessar, que a maior parte dos mortais, sem ser afectada, sem se ver seriamente ameaçada por mal algum, vive em permanente e confusa agitação. É que nenhum conserva o governo de si mesmo"
(Séneca, in 'Dos Reveses' )
"Quando é que emfim virá o claro dia,
- O dia glorioso e suspirado! -
Que não corra mais sangue, esperdiçado
Á luz do Sol que os mundos alumia?! -
Que os vencidos não vejam a agonia
Do seu tecto de colmo incendiado,
E se ouça retumbar o monte e o prado,
Ao tropel da velloz cavallaria?!
Quando é que isto será? - Quando na vida,
Virá ella, a doce hora promettida,
Hora cheia d'amor, e desejada!...
Em que fataes Cains, fartos da guerra,
Nosso sangue não beba mais a terra...
- E nem mesmo a Justiça use d'Espada?!"
(António Gomes Leal, in 'Claridades do Sul')