segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

dizer

"Hei-de por força dizer o que me parece, visto que sou eu"
(Fernando Pessoa, Livro do Desassossego)

sábado, 27 de dezembro de 2008

sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

voz de fonte



"Como uma voz de fonte que cessasse
(E uns para os outros nossos vãos olhares
Se admiraram), p’ra além dos meus palmares
De sonho, a voz que do meu tédio nasce
Parou... Apareceu já sem disfarce
De música longínqua, asas nos ares,
O mistério silente como os mares,
Quando morreu o vento e a calma pasce...

A paisagem longínqua só existe
Para haver nela um silêncio em descida
P’ra o mistério, silêncio a que a hora assiste...
E, perto ou longe, grande lago mudo,
O mundo, o informe mundo onde há a vida...
E Deus, a Grande Ogiva ao fim de tudo..."

Fernando Pessoa, in "Cancioneiro"

terça-feira, 23 de dezembro de 2008

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

acasos e percalços?!

"O acaso assemelha-se a nós" (Georges Bernanos); "é o grande mestre de todas as coisas"?!(Luis Bunuel)

domingo, 21 de dezembro de 2008

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

resposta-pergunta-resposta

"ao contrário do que se julga, não são tanto as respostas que me importam, mas as perguntas, obviamente refiro-me às nossas, observe como elas costumam ter, ao mesmo tempo, um objectivo à vista e uma intenção que vai escondida atrás, se as fazemos não é apenas para que nos respondam o que nesse momento necessitamos que os interpelados escutem da sua própria boca, é também para que se vá preparando o caminho às futuras respostas"
José Saramago in As Intermitências da Morte

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

vida

"A nossa vida, como repertório de possibilidades, é magnífica, exuberante, superior a todas as históricamente conhecidas. Mas assim como o seu formato é maior, transbordou todos os caminhos, princípios, normas e ideais legados pela tradição. É mais vida que todas as vidas, e por isso mesmo mais problemática. Não pode orientar-se no pretérito. Tem de inventar o seu próprio destino. Mas agora é preciso completar o diagnóstico. A vida, que é, antes de tudo, o que podemos ser, vida possível, é também, e por isso mesmo, decidir entre as possibilidades o que em efeito vamos ser. Circunstâncias e decisão são os dois elementos radicais de que se compõe a vida. A circunstância – as possibilidades – é o que da nossa vida nos é dado e imposto. Isso constitui o que chamamos o mundo. A vida não elege o seu mundo, mas viver é encontrar-se, imediatamente, em um mundo determinado e insubstituível: neste de agora. O nosso mundo é a dimensão de fatalidade que integra a nossa vida. Mas esta fatalidade vital não se parece à mecânica. Não somos arremessados para a existência como a bala de um fuzil, cuja trajectória está absolutamente pré-determinada. A fatalidade em que caímos ao cair neste mundo – o mundo é sempre este, este de agora – consiste em todo o contrário. Em vez de impor-nos uma trajetória, impõe-nos várias e, consequentemente, força-nos... a eleger. Surpreendente condição a da nossa vida! Viver é sentir-se fatalmente forçado a exercitar a liberdade, a decidir o que vamos ser neste mundo. Nem num só instante se deixa descansar a nossa actividade de decisão. Inclusivé quando desesperados nos abandonamos ao que queira vir, decidimos não decidir. É, pois, falso dizer que na vida «decidem as circunstâncias». Pelo contrário: as circunstâncias são o dilema, sempre novo, ante o qual temos de nos decidir. Mas quem decide é o nosso carácter. " (Ortega y Gasset)

http://www.youtube.com/watch?v=LU_QR_FTt3E&feature=related


"Enfim duma escolha faz-se um desafio
enfrenta-se a vida de fio a pavio
navega-se sem mar, sem vela ou navio
bebe-se a coragem até dum copo vazio
e vem-nos à memória uma frase batida
hoje é o primeiro dia do resto da tua vida

E entretanto o tempo fez cinza da brasa
e outra maré cheia virá da maré vazia
nasce um novo dia e no braço outra asa
brinda-se aos amores com o vinho da casa
e vem-nos à memória uma frase batida
hoje é o primeiro dia do resto da tua vida. " (Sérgio Godinho)

domingo, 14 de dezembro de 2008

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

sábado, 29 de novembro de 2008

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

quando está frio

"Quando está frio no tempo do frio, para mim é como se estivesse agradável,
Porque para o meu ser adequado à existência das cousas

O natural é o agradável só por ser natural.
Aceito as dificuldades da vida porque são o destino,
Como aceito o frio excessivo no alto do Inverno —
Calmamente, sem me queixar, como quem meramente aceita,
E encontra uma alegria no fato de aceitar —
No fato sublimemente científico e difícil de aceitar o natural inevitável.

Que são para mim as doenças que tenho e o mal que me acontece
Senão o Inverno da minha pessoa e da minha vida?
O Inverno irregular, cujas leis de aparecimento desconheço,
Mas que existe para mim em virtude da mesma fatalidade sublime,
Da mesma inevitável exterioridade a mim,
Que o calor da terra no alto do Verão
E o frio da terra no cimo do Inverno.

Aceito por personalidade.
Nasci sujeito como os outros a erros e a defeitos,
Mas nunca ao erro de querer compreender demais,
Nunca ao erro de querer compreender só corri a inteligência,
Nunca ao defeito de exigir do Mundo
Que fosse qualquer cousa que não fosse o Mundo."

Alberto Caeiro - Poemas Inconjuntos

terça-feira, 25 de novembro de 2008

mano,the love of my life

irmão,não fiques com inveja.. acredita na/luta pela amizade profunda e verdadeira.
conselho de irmã mais velha :)

foi,é,será

"É acreditando nas rosas que as fazemos desabrochar" (Anatole France)

domingo, 23 de novembro de 2008

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

René François Ghislain Magritte

21 de Novembro de 1898, Lessines - 15 Agosto de 1967, foi um dos principais artistas surrealistas belgas. Muita da sua pintura assemelha-se a: “Nenhum objecto é cristalizado com o seu nome assim irrevogavelmente que se não pode encontrar outro que o serve para melhorar”.






Talvez o que o tenha tornado famoso até hoje seja o seu intrigante cachimbo que não é. Nas suas palavras: “Um intelectual é aquele que ao ouvir a palavra cachimbo pensa em Magritte”.










Mas o seu trabalho não se resume a isso, porque “A mente ama o desconhecido. Ela ama as imagens de significados ocultos, desde que desconhecemos o significado da própria mente”. E isso é cristalinamente perceptível ao vislumbrarmos os Amantes.











Magritte, gostava dos chapéus-coco, facto muito presente em diversas telas, como na The son of a Man, e essa característica tem muito em comum com a personagem do livro chamado A insustentável leveza do ser (de Milan Kundera), mas só isso, porque "um objecto nunca serve como função da sua imagem - nem em seu nome". Pensar que "tudo o que vemos esconde alguma coisa, e nós desejamos sempre ver algo que está escondido por aquilo que vemos".










quinta-feira, 20 de novembro de 2008

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

quem não tem medo de naufragar

Odivelas

A propósito do nome desta cidade, conta-se que D. Dinis tinha o hábito de deslocar-se à noite a Odivelas onde se encontrava regularmente com raparigas do seu agrado. Certa noite, sabendo a rainha do que se passava resolveu esperá-lo e quando o rei fazia o seu percurso para o encontro, a rainha interpelou-o e eis que proferiu as seguintes palavras:
"- Ide vê-las senhor....."
Afirma-se que de "Ide vê-las", por evolução, teria surgido o nome Odivelas.

Os filólogos dão porém, outra explicação: a palavra compõem-se de dois elementos: "Odi" e "Velas". A primeira é de origem árabe e significa "curso de água". A segunda é de origem latina e refere-se às velas dos moinhos de vento, que existiram nos outeiros próximos e dos quais podemos ainda ver vestígios. O curso de água ainda se mantém hoje.

No dia 19 de Novembro de 1998, com o voto unânime dos Deputados de todas as forças políticas, a Assembleia da República votava, na especialidade, e em votação final global, o Projecto de Lei da Criação do Município de Odivelas.

fim

"No fim de tudo dormir.
No fim de quê?
No fim do que tudo parece ser...,
Este pequeno universo provinciano entre os astros,
Esta aldeola do espaço,
E não só do espaço visível, mas até do espaço total."
(Álvaro de Campos)


http://www.youtube.com/watch?v=xq-ZmAYLeB8&feature=channel

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

pequenas coisas

"Uma árvore está quieta,
murcha, desprezada.
Mas se o poeta a levanta pelos cabelos
e lhe sopra os dedos,
ela volta a empertigar-se, renovada."
(..)
Fora de ti há o mundo
e nele há tudo
que em ti não cabe."


Fernando Namora, in "Mar de Sargaços"

terça-feira, 11 de novembro de 2008

sábado, 8 de novembro de 2008

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

yes we can...


..be heroes


..work it out


..make the morning


..make it happen again


..acreditar.lutar.por tudo

conversação

"O tipo de bem-estar proporcionado por uma conversação animada não consiste propriamente no assunto da conversação; nem as idéias nem os conhecimentos que ali podem ser desenvolvidos são o seu principal interesse. Importa uma certa maneira de agir uns sobre os outros, de ter um prazer recíproco e rápido, de falar tão logo se pense, de comprazer-se imediatamente consigo mesmo, de ser aplaudido sem esforço, de manifestar o seu espírito em todas as nuances pela entoação, pelo gesto, pelo olhar, enfim, de produzir à vontade como que uma espécie de electricidade que solta faíscas, aliviando uns do próprio excesso da sua vivacidade e despertando outros de uma apatia dolorosa. (...) Bacon disse que "a conversação não era um caminho que conduzia à casa, mas uma vereda por onde se passeava prazerosamente ao acaso".
(Madame de Stael, in 'Do Espírito de Conversação')

terça-feira, 4 de novembro de 2008

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

sábado, 1 de novembro de 2008

Paula Rego

“O coelhinho deste quadro está mesmo a querer violar a menina a quem levanta a saia?, o cãozinho é mau para o homem que está deitado no chão de rabo para o ar?, etc. Paula Rego entra no jogo com respostas do tipo "Não, não, o coelhinho não está a fazer mal à menina, eles estão a brincar à apanhada". diálogos agradáveis, divertidos e também interessantes sobre estórias infantis ensombradas pelos fantasmas e violência dos adultos." (..) "O tom de voz modificou-se, abandonou o registo ingénuo e infantil com que fala de coelhinhos e meninas e explicou porque optou pela pintura figurativa em detrimento da abstracção; insistiu que cada quadro é uma composição que "descreve uma situação a que se chama uma estória"; e disse que a técnica conta tanto ou mais que a estória: "é uma coisa entre as duas", "o tema e a maneira como é feita a composição, a cor, a tensão entre os vários elementos da composição." (..) "É como olhar para o que se passou na minha vida"


quarta-feira, 29 de outubro de 2008

árvore



"Cada árvore é um ser para ser em nós

Para ver uma árvore não basta vê-la

a árvore é uma lenta reverência

uma presença reminiscente

uma habitação perdida

e encontrada

À sombra de uma árvore

o tempo já não é o tempo

mas a magia de um instante que começa sem fim

a árvore apazigua-nos com a sua atmosfera de folhas

e de sombras interiores

nós habitamos a árvore com a nossa respiração

com a da árvore

com a árvore nós partilhamos o mundo com os deuses" (António Rosa)



terça-feira, 28 de outubro de 2008

domingo, 26 de outubro de 2008

pastor do monte

"Pastor do monte, tão longe de mim com as tuas ovelhas
Que felicidade é essa que pareces ter — a tua ou a minha?
A paz que sinto quando te vejo, pertence-me, ou pertence-te?
Não, nem a ti nem a mim, pastor.
Pertence só à felicidade e à paz.
Nem tu a tens, porque não sabes que a tens.
Nem eu a tenho, porque sei que a tenho.
Ela é ela só, e cai sobre nós como o sol,
Que te bate nas costas e te aquece, e tu pensas
noutra cousa indiferentemente,
E me bate na cara e me ofusca. e eu só penso no sol."
(Alberto Caeiro)

clocks

sábado, 25 de outubro de 2008

alô,alô



.. estará mesmo down,down,down?!

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

os degraus

Não desças os degraus do sonho
Para não despertar os monstros.
Não subas aos sótãos - onde
Os deuses, por trás das suas máscaras,
Ocultam o próprio enigma.
Não desças, não subas, fica.
O mistério está é na tua vida!
E é um sonho louco este nosso mundo...

(Mario Quintana - Baú de Espantos)

terça-feira, 21 de outubro de 2008

produção caseira?!

Bolo de côco

300g de açúcar
300g de farinha
150g de margarina
2 dl de leite
100g de coco ralado seco
6 ovos

1- Bater a margarina com o açúcar em creme, juntar as gemas uma a uma batendo entre cada adição.
2- Adicionar o leite alternando com a farinha peneirada e o côco.
3- Bater as claras em castelo e envolvê-las na massa.
4- Deitar a massa em forma nº26 de canudo untada e enfarinhada e levar ao forno moderado apx. 45m.

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

tempo



Antonin Dvorak, tempo di valse

sábado, 18 de outubro de 2008

leguminosas

descanso

A mente não se deve manter sempre na mesma intenção ou tensão, antes deve dar-se também à diversão. Sócrates não se envergonhava de brincar com as crianças, Catão aliviava com vinho o seu ânimo fatigado dos cuidados públicos e Cipião dançava com aquele corpo triunfante e militar (...) O nosso espírito deve relaxar: ficará melhor e mais apto após um descanso. Tal como não devemos forçar um terreno agrícola fértil com uma produtividade ininterrupta que depressa o esgotaria, também o esforço constante esvaziará o nosso vigor mental, enquanto um curto período de repouso restaurará o nosso poder. O esforço continuado leva a um tipo de torpor mental e letargia. Nem os desejos dos homens devem encaminhar-se tão depressa nesta direcção se o desporto e o jogo os envolvem numa espécie de prazer natural; embora uma repetida prática destrua toda a gravidade e força do nosso espírito. Afinal, o sono também é essencial para nos restaurar, mas se o prolongássemos constantemente, dia e noite, seria a morte. (Séneca in "da brevidade da vida")

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

carteira de identidade

"Regista-me/ sou árabe/...../ trabalho com meus companheiros de luta/ numa pedreira/…../ arranco das pedras/ o pão, as roupas, os cadernos/ e não venho mendigar em tua porta/...../ minhas raízes/ fixadas antes do nascimento dos tempos/ antes da eclosão dos séculos/.…./ meu endereço/ sou de um povoado perdido...esquecido/ de ruas sem nome/ e todos os seus homens…no campo e na pedreira/ vais-te irritar por acaso?" (Mahmud Darwish)

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

não há longe nem distância - bach

"(...) Não tens aniversário porque sempre viveste; nunca nasceste e nunca morrerás, não és filha daqueles a quem chamas mãe e pai, és o seu companheiro de aventuras na maravilhosa viagem de descoberta de tudo o que existe.
Cada prenda de um amigo é uma esperança na tua felicidade; assim é este anel.
Voa, livre e feliz, para além de aniversários, através da eternidade e encontrar-nos-emos de vez em quando, sempre que quisermos, no meio da única festa que nunca poderá terminar."

domingo, 12 de outubro de 2008

1994

Já lá vão 14 anos!


quinta-feira, 2 de outubro de 2008

olá

José Cardoso Pires

nasceu a 2 Outubro em São João do Peso, Vila de Rei.

"Pássaros pontilhando a ramaria, o horizonte do mar por cima da copa das árvores e entre o céu e a linha de água uma luzinha fria a caminhar para o crepúsculo. Um petroleiro? Elias demora-se a olhar. Tempo ao tempo. Só no dia seguinte começará o inventário dos sinais e dos palpites, confiado como sempre no Velhaco das Algemas. Tempo ao tempo. Mais depressa se apanha um assassino que um morto, porque, como dizia o outro, o morto voa a cavalo na alma e o assassino tropeça no medo." (Balada da Praia dos Cães)

terça-feira, 30 de setembro de 2008

anatomia de grey

"A história mais importante é a que se faz hoje"

sábado, 27 de setembro de 2008

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

domingo, 21 de setembro de 2008

"Se procurar bem você acaba encontrando.
Não a explicação (duvidosa) da vida,
Mas a poesia (inexplicável) da vida. "
(Carlos Drummond de Andrade)

canção de embalar

sábado, 20 de setembro de 2008

Cágado

"Havia um homem que era muito senhor da sua vontade. Andava às vezes sozinho pelas estradas a passear. Por uma dessas vezes viu no meio da estrada um animal que parecia não vir a propósito — um cágado.O homem era muito senhor da sua vontade, nunca tinha visto um cágado; contudo, agora estava a acreditar. Acercou-se mais e viu com os olhos da cara que aquilo era, na verdade, o tal cágado da zoologia.O homem que era muito senhor da sua vontade ficou radiante, já tinha novidades para contar ao almoço, e deitou a correr para casa. A meio caminho pensou que a família era capaz de não aceitar a novidade por não trazer o cágado com ele, e parou de repente. Como era muito senhor da sua vontade, não poderia suportar que a família imaginasse que aquilo do cágado era história dele, e voltou atrás. 0uando chegou perto do tal sítio, o cágado, que já tinha desconfiado da primeira vez, enfiou buraco abaixo como quem não quer a coisa.O homem que era muito senhor da sua vontade pôs-se a espreitar para dentro e depois de muito espreitar não conseguiu ver senão o que se pode ver para dentro dos buracos, isto é, muito escuro. Do cágado, nada. Meteu a mão com cautela e nada; a seguir até ao cotovelo e nada; por fim o braço todo e nada. Tinham sido experimentadas todas as cautelas e os recursos naturais de que um homem dispõe até ao comprimento do braço e nada.Então foi buscar auxílio a uma vara compridíssima, que nem é habitual em varas haver assim tão compridas, enfiou-a pelo buraco abaixo, mas o cágado morava ainda muito mais lá para o fundo. Quando largou a vara, ela foi por ali abaixo, exatamente como uma vara perdida.Depois de estudar novas maneiras, a ofensiva ficou de fato submetida a nova orientação. Havia um grande tanque de lavadeiras a dois passos e ao lado do tanque estava um bom balde dos maiores que há. Mergulhou o balde no tanque e, cheio até mais não, despejou-o inteiro para dentro do buraco do cágado. Um balde só já ele sabia que não bastava, nem dez, mas quando chegou a noventa e oito baldes e que já faltavam só dois para cem e que a água não havia meio de vir ao de cima, o homem que era muito senhor da sua vontade pôs-se a pensar em todas as espécies de buracos que possa haver.— E se eu dissesse à minha família que tinha visto o cágado? - pensava para si o homem que era muito senhor da sua vontade. Mas não! Toda a gente pode pensar assim menos eu, que sou muito senhor da minha vontade.O maldito sol também não ajudava nada. Talvez que fosse melhor não dizer nada do cágado ao almoço. A pensar se sim ou não, os passos dirigiam-se involuntariamente para as horas de almoçar.— Já não se trata de eu ser um incompreendido com a história do cágado, não; agora trata-se apenas da minha força de vontade. É a minha força de vontade que está em prova, esta é a ocasião propícia, não percamos tempo! Nada de fraquezas!Ao lado do buraco havia uma pá de ferro, destas dos trabalhadores rurais. Pegou na pá e pôs-se a desfazer o buraco. A primeira pazada de terra, a segunda, a terceira, e era uma maravilha contemplar aquela majestosa visibilidade que punha os nossos olhos em presença do mais eficaz testemunho da tenacidade, depois dos antigos. Na verdade, de cada vez que enfiava a pá na terra, com fé, com robustez, e sem outras intenções a mais, via-se perfeitamente que estava ali uma vontade inteira; e ainda que seja cientificamente impossível que a terra rachasse de cada vez que ele lhe metia a pá, contudo era indiscutivelmente esta a impressão que lhe dava. Ah, não! Não era um vulgar trabalhador rural. Via-se perfeitamente que era alguém muito senhor da sua vontade e que estava por ali por acaso, por imposição própria, contrafeito, por necessidade do espírito, por outras razões diferentes das dos trabalhadores rurais, no cumprimento de um dever, um dever importante, uma questão de vida ou de morte — a vontade.Já estava na nonagésima pazada de terra; sem afrouxar, com o mesmo ímpeto da inicial, foi completamente indiferente por um almoço a menos. Fosse ou não por um cágado, a humanidade iria ver solidificada a vontade de um homem.A mil metros de profundidade a pino, o homem que era muito senhor da sua vontade foi surpreendido por dolorosa dúvida — já não tinha nem a certeza se era a qüinquagésima milionésima octogésima quarta. Era impossível recomeçar, mais valia perder uma pazada.Até ali não havia indícios nem da passagem da vara, da água ou do cágado. Tudo fazia crer que se tratava de um buraco supérfluo; contudo, o homem era muito senhor da sua vontade, sabia que tinha de haver-se de frente com todas as más impressões. De fato, se aquela tarefa não houvesse de ser árdua e difícil, também a vontade não podia resultar superlativamente dura e preciosa.Todas as noções de tempo e de espaço, e as outras noções pelas quais um homem constata o quotidiano, foram todas uma por uma dispensadas de participar no esburacamento. Agora, que os músculos disciplinados num ritmo único estavam feitos ao que se quer pedir, eram desnecessários todos os raciocínios e outros arabescos cerebrais, não havia outra necessidade além da dos próprios músculos.Umas vezes a terra era mais capaz de se deixar furar por causa das grandes camadas de areia e de lama; todavia, estas facilidades ficavam bem subtraídas quando acontecia ser a altura de atravessar uma dessas rochas gigantescas que há no subsolo. Sem incitamento nem estímulo possível por aquelas paragens, é absolutamente indispensável recordar a decisão com que o homem muito senhor da sua vontade pegou ao princípio na pá do trabalhador rural para justificarmos a intensidade e a duração desta perseverança. Inclusive, a própria descoberta do centro da Terra, que tão bem podia servir de regozijo ao que se aventura pelas entranhas do nosso planeta, passou infelizmente desapercebida ao homem que era muito senhor da sua vontade. O buraco do cágado era efetivamente interminável. Por mais que se avançasse, o buraco continuava ainda e sempre. Só assim se explica ser tão rara a presença de cágados à superfície devido à extensão dos corredores desde a porta da rua até aos aposentos propriamente ditos.Entretanto, cá em cima na terra, a família do homem que era muito senhor da sua vontade, tendo começado por o ter dado por desaparecido, optara, por último, pelo luto carregado, não consentindo a entrada no quarto onde ele costumava dormir todas as noites.Até que uma vez, quando ele já não acreditava no fim das covas, já não havia, de fato, mais continuação daquele buraco, parava exatamente ali, sem apoteose, sem comemoração, sem vitória, exatamente como um simples buraco de estrada onde se vê o fundo ao sol. Enfim, naquele sítio nem a revolta servia para nada.Caindo em si, o homem que era muito senhor da sua vontade pediu-lhe decisões, novas decisões, outras; mas ali não havia nada a fazer, tinha esquecido tudo, estava despejado de todas as coisas, só lhe restava saber cavar com uma pá. Tinha, sobretudo, muito sono, lembrou-se da cama com lençóis, travesseiro e almofada fofa, tão longe! Maldita pá! 0 cágado! E deu com a pá com força no fundo da cova. Mas a pá safou-se-lhe das mãos e foi mais fundo do que ele supunha, deixando uma greta aberta por onde entrava uma coisa de que ele já se tinha esquecido há muito - a luz do sol. A primeira sensação foi de alegria, mas durou apenas três segundos, a segunda foi de assombro: teria na verdade furado a Terra de lado a lado?Para se certificar alargou a greta com as unhas e espreitou para fora. Era um país estrangeiro; homens, mulheres, árvores, montes e casas tinham outras proporções diferentes das que ele tinha na memória. 0 sol também não era o mesmo, não era amarelo, era de cobre cheio de azebre e fazia barulho nos reflexos. Mas a sensação mais estranha ainda estava para vir: foi que, quando quis sair da cova, julgava que ficava em pé em cima do chão como os habitantes daquele país estrangeiro, mas a verdade é que a única maneira de poder ver as coisas naturalmente era pondo-se de pernas para o ar...Como tinha muita sede, resolveu ir beber água ali ao pé e teve de ir de mãos no chão e o corpo a fazer o pino, porque de pé subia-lhe o sangue à cabeça. Então, começou a ver que não tinha nada a esperar daquele país onde nem sequer se falava com a boca, falava-se com o nariz.Vieram-lhe de uma vez todas as saudades da casa, da família e do quarto de dormir. Felizmente estava aberto o caminho até casa, fora ele próprio quem o abrira com uma pá de ferro. Resolveu-se. Começou a andar o buraco todo ao contrário. Andou, andou, andou; subiu, subiu, subiu...Quando chegou cá acima, ao lado do buraco estava uma coisa que não havia antigamente — o maior monte da Europa, feito por ele, aos poucochinhos, às pazadas de terra, uma por uma, até ficar enorme, colossal, sem querer, o maior monte da Europa.Este monte não deixava ver nem a cidade onde estava a casa da família, nem a estrada que dava para a cidade, nem os arredores da cidade que faziam um belo panorama. O monte estava por cima disto tudo e de muito mais.O homem que era muito senhor da sua vontade estava cansadíssimo por ter feito duas vezes o diâmetro da Terra. Apetecia-lhe dormir na sua querida cama, mas para isso era necessário tirar aquele monte maior da Europa, de cima da cidade, onde estava a casa da sua família. Então, foi buscar outra pá dos trabalhadores rurais e começou logo a desfazer o monte maior da Europa. Foi restituindo à Terra, uma por uma, todas as pazadas com que a tinha esburacado de lado a lado. Começavam já a aparecer as cruzes das torres, os telhados das casas, os cumes dos montes naturais, a casa da sua família, muita gente suja de terra, por ter estado soterrada, outros que ficaram aleijados, e o resto como dantes.O homem que era muito senhor da sua vontade já podia entrar em casa para descansar, mas quis mais, quis restituir à Terra todas as pazadas, todas. Faltavam poucas, algumas dúzias apenas. Já agora valia a pena fazer tudo bem até ao fim. Quando já era a última pazada de terra que ele ia meter no buraco, portanto a primeira que ele tinha tirado ao princípio, reparou que o torrão estava a mexer por si, sem ninguém lhe tocar; curioso, quis ver porque era — era o cágado. " (Almada Negreiros)

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

"Apenas as palavras quebram o silêncio, todos os outros sons cessaram. Se eu estivesse silencioso, não ouviria nada. Mas se eu me mantivesse silencioso, os outros sons recomeçariam, aqueles a que as palavras me tornaram surdo, ou que realmente cessaram. Mas estou silencioso, por vezes acontece, não, nunca, nem um segundo. Também choro sem interrupção. É um fluxo incessante de palavras e lágrimas. Sem pausa para reflexão. Mas falo mais baixo, cada ano um pouco mais baixo. Talvez. Também mais lentamente, cada ano um pouco mais lentamente. Talvez. É-me difícil avaliar. Se assim fosse, as pausas seriam mais longas, entre as palavras, as frases, as sílabas, as lágrimas, confundo-as, palavras e lágrimas, as minhas palavras são as minhas lágrimas, os meus olhos a minha boca. E eu deveria ouvir, em cada pequena pausa, se é o silêncio que eu digo quando digo que apenas as palavras o quebram. Mas nada disso, não é assim que acontece, é sempre o mesmo murmúrio, fluindo ininterruptamente, como uma única palavra infindável e, por isso, sem significado, porque é o fim que confere o significado às palavras." (Samuel Beckett)

terça-feira, 16 de setembro de 2008


"Só arriscando a nossa vida conservamos a liberdade, só assim provamos que a essência da consciência de si próprio não é o ser, não é o modo imediato como essa consciência surge em primeiro lugar, não é a sua fixação na expansão da vida. "
(Georg Hegel)

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

escolha,a seara

"Uma vida depende das escolhas que fizermos. Temos de saber o que é ou não importante para nós. A escolha inteligente implica um sentido realista dos valores e um sentido realista das proporções. Este processo de escolha - de aceitação por um lado e de rejeição pelo outro - começa na infância e continua pela vida fora. Não podemos ter tudo o que ambicionamos. O homem de negócios que procura o sucesso financeiro tem muitas vezes de abandonar os seus interesses de ordem desportiva ou cultural. Os que preferem servir os interesses espirituais, culturais ou políticos da sociedade - sacerdotes, escritores, artistas, militares, homens de estado e funcionários públicos em geral - têm quase sempre de relegar para segundo plano o bem-estar financeiro.
Com uma vida limitada não podemos ser ou fazer tudo. Estamos constantemente a ter de escolher com que e com quem passar o nosso tempo. Cultivar amizades toma tempo. Às vezes temos de recusar encontros e desapontar muitas pessoas para termos tempo de alcançar os nossos fins. Todos os dias temos de escolher entre as coisas que estão à venda. Não podemos ter o mundo inteiro, tal como uma criança não pode comprar todos os rebuçados da doçaria se tiver apenas um tostão. Esta é uma das grandes lições da vida. Temos de escolher na altura própria, e o destino é a seara que cresce da semente da escolha."

(Alfred Montapert)

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

"Nunca ninguém se perdeu, Tudo é verdade e caminho."
(Fernando Pessoa)

terça-feira, 9 de setembro de 2008

fado das caravelas



"O fado das caravelas,
Trazido pelos marinheiros,
Veio rufia junto à proa.
E por ruas e vielas,
Deu os seus passos primeiros,
Pelos bairros de Lisboa.

Logo após entrar na barra,
E mal atracou na doca,
Alguém p'lo fado chama,
Era ansiosa a guitarra

(...)

Fez-se alma portuguesa,
É eco da nossa voz,
P'la guitarra acompanhado,
É só nosso com certeza,
O fado habita em nós,
Ou somos nós feitos fado!... "
(Euclides Cavaco)

sábado, 6 de setembro de 2008

futuro

Sarabande

http://www.youtube.com/watch?v=8DfDVQ0pdfo

lei

"E enquanto uma chora, outra ri; é a lei do mundo, meu rico senhor; é a perfeição universal. Tudo chorando seria monótono, tudo rindo, cansativo; mas uma boa distribuição de lágrimas e polcas, soluços e sarabandas, acaba por trazer à alma do mundo a variedade necessária, e faz-se o equilíbrio da vida."

(Machado de Assis, in Quincas Borba)

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

absoluto

"Era um tipo estranho. Digo bem "um tipo". Olho um homem, uma mulher, e nem sempre me é possível tentar sequer abordar-lhe a pessoa por dentro. Porque há indivíduos que irresistivelmente reduzimos a "objectos". São os indivíduos "característicos" com tiques, com uma aparência de traços nítidos. Compreendo a tentação da caricatura: a um olhar sem mistério, os homens são a caricatura do homem. Por isso o romance tem ignorado a outra zona. Ah, escrever um romance que se gerasse nesse ar rarefeito de nós próprios, no alarme da nossa própria pessoa, na zona incrível do sobressalto! Atingir não bem o que se é "por dentro", a "psicologia", o modo íntimo de se ser, mas a outra parte, a que está antes dessa, a pessoa viva, a pessoa absoluta. Um romance que ainda não há... Porque há só ainda romances de coisas - coisas vistas por fora ou coisas vistas por dentro. Um romance que se fixasse nessa iluminação viva de nós, nessa dimensão ofuscante do halo de nós... "
(Vergílio Ferreira, Estrela Polar)

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Ponte


“Entre instante e instante,
entre eu sou e tu és,
a palavra ponte.

Entras em ti mesma
ao entrar nela:
como um anel
o mundo fecha-se.

De uma margem à outra
há sempre um corpo que se estende,
um arco-íris.

Eu dormirei sob os seus arcos.”

(Octávio Paz, 1998)

sábado, 30 de agosto de 2008

António Menano

Voltemos às ruas:
Nascido nas faldas da Serra da Estrela de uma família de 12 irmãos, António Menano(1895 - 1969) foi sem sombra de dúvida o mais conhecido e popular cantor de fados de Coimbra. Com onze anos, já cantava e compunha fados e em Coimbra, onde estudou Medicina, cedo se tornou ídolo da Academia, enriquecendo o espírito estudantil e a lenda coimbrã de uma certa boémia própria da juventude, de fados e serenatas, misto de arte e romantismo, de sonhos e ilusões. António Menano está tão intimamente ligado ao fado de Coimbra e este a ele que se não pode dissociar um do outro; falar de António Menano é falar do fado de Coimbra e da chamada década de oiro.


sexta-feira, 29 de agosto de 2008

Michael Jackson - 50 anos

Michael Joseph Jackson nasceu em Gary, Indiana, a 29 de Agosto de 1958.
É o sétimo de nove filhos de Joseph e Katherine Jackson.
Resultado da rigidez do pai, as crianças eram mantidas trancadas em casa enquanto ele trabalhava até tarde; mas escapavam frequentemente para as casas dos vizinhos, onde cantavam e faziam música. Tudo se manteve até ao dia em que Joseph tomou consciência do talento dos filhos e resolveu lucrar com isso. Michael Jackson começou a carreira aos cinco anos de idade como líder vocal do grupo Jackson 5.




quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Eia! Eia! Eia!

“À dolorosa luz das grandes lâmpadas eléctricas da fábrica
Tenho febre e escrevo.
Escrevo rangendo os dentes, fera para a beleza disto,
Para a beleza disto totalmente desconhecida dos antigos.
Ó rodas, ó engrenagem, r-r-r-r-r-r eterno!
Forte espasmo retido dos maquinismos em fúria!
Em fúria fora e dentro de mim,
Por todos os meus nervos dissecados fora,
Por todas as papilas fora de tudo com que eu sinto!
Tenho os lábios secos, ó grandes ruídos modernos,
De vos ouvir demasiadamente de perto,
E arde-me a cabeça de vos querer cantar com um excesso
De expressão de todas as minhas sensações,
Com um excesso contemporâneo de vós, ó máquinas! (...)
Canto, e canto o presente, e também o passado e o futuro.
Porque o presente é todo o passado e o futuro. (...)
Ah, poder exprimir-me todo como um motor se exprime!
Ser completo como uma máquina!
(...)
Engenhos, brocas, máquinas rotativas!
Eia! eia! eia!
Eia electricidade, nervos doentes da Matéria!
Eia telegrafia-sem-fios, simpatia metálica do Inconsciente!
Eia túneis, eia canais, Panamá, Kiel, Suez!
Eia todo o passado dentro do presente!
Eia todo o futuro já dentro de nós! eia!
Eia! eia! eia!
Frutos de ferro e útil da árvore-fábrica cosmopolita!
Eia! eia! eia, eia-hô-ô-ô!
Nem sei que existo para dentro. Giro, rodeia, engenho-me.
Engatam-me em todos os comboios.
Içam-me em todos os cais.
Giro dentro das hélices de todos os navios.
Eia! eia-hô eia!
Eia! sou o calor mecânico e a electricidade!
Eia! e os rails e as casas de máquinas e a Europa!
Eia e hurrah por mim-tudo e tudo, máquinas e trabalhar, eia!
Galgar com tudo por cima de tudo! Hup-lá!
Hup-lá, hup-lá, hup-lá-hô, hup-lá!
Hé-lá! He-hô Ho-o-o-o-o!
Z-z-z-z-z-z-z-z-z-z-z-z!
Ah não ser eu toda a gente e toda a parte!”
(Álvaro de Campos, Ode Triunfal)

terça-feira, 26 de agosto de 2008

Já lá vao 20 anos

"Ai rapariga, rapariga, rapariga
Que só dizes disparates, disparates, disparates
E tanta asneira, tanta asneira, tanta asneira
Que para tirar tanta asneira não chegam 100 alicates
Mas tu não sabes, tu não sabes, tu não sabes
Que isso de dar um beijinho já é um custume antigo
Quem te disse, quem te disse, quem te disse
Que lá por dares um beijinho tinhas de casar comigo.

- Ó chega cá.
- Não vou.
- Tu és tão linda.
- Pois sou.
- Dá-me um beijinho.
- Não dou.

Interesseirea, convencida, ignorante, foragida, sua burra,
És a miúda mais palerma, camelóide que eu já vi
Mas porque raio é que tu queres os beijinhos só para ti.

Ora dá cá um e a seguir dá outro
Depois dá mais um que só dois é pouco
Ai eu gosto tanto e é tão docinho
E no entretanto dá mais um beijinho.

Ora dá cá um e a seguir dá outro
Depois dá mais um que só dois é pouco
Ai eu gosto tanto e é tão docinho
E no entretanto dá mais um beijinho.

Ai rapariga, rapariga, rapariga
Dás-me cabo do miolo para te levar com cantigas
Ai mas que coisa, mas que coisa, mas que coisa
Diz lá porque é que tu não és como as outras raparigas
Quando eu pergunto se elas me dão um beijinho
Dão- me tantos, tantos, tantos que parecem não ter fim
E tu agora estás com tanta esquisitice
Que qualquer dia já queres e não sabes mais de mim.

- Dás ou não dás?
- Não, não.
- Então dou eu.
- Isso não
- Dá-me um beijinho.
- Não dou não.

Diz lá porquê, sua esganada, egoísta, mal-criada
Sua parva, só se pensas que eu acaso tenho a barba mal cortada
E vê lá se tens receio que a boca fique arranhada.

Ora dá cá um e a seguir dá outro
Depois dá mais um que só dois é pouco
Ai eu gosto tanto e é tão docinho
E no entretanto dá mais um beijinho.

Ora dá cá um e a seguir dá outro
Depois dá mais um que só dois é pouco
Ai eu gosto tanto e é tão docinho
E no entretanto dá mais um beijinho.

- Então vá lá.
- Já disse.
- Eu faço força.
- Que parvoíce
- Dá-me um beijinho.
- Que chatice.

Analfarruta, pestilenta, hipocondriaca, avarenta, bexigosa
Vou comprar um dicionário que só tenha nomes feios
Que é para eu tos chamar todos até tu teres os ouvidos cheios.

Ora dá cá um e a seguir dá outro
Depois dá mais um que só dois é pouco
Ai eu gosto tanto e é tão docinho
E no entretanto dá mais um beijinho.

Ora dá cá um e a seguir dá outro
Depois dá mais um que só dois é pouco
Ai eu gosto tanto e é tão docinho
E no entretanto dá mais um beijinho."
(Carlos Paião, Canção do beijinho)

E para ver e ouvir :








domingo, 24 de agosto de 2008

Beijing-Pequim 08 ... London-Londres 12

Cada cor dos anéis olímpicos representa um continente: Azul-Europa, Amarelo-Ásia, Preto-África, Verde-Oceania e Vermelho-América. Foi,é e será a união do mundo em torno do desporto. Que nao perca a essência.

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

XLVIII

"Da mais alta janela da minha casa
Com um lenço branco digo adeus
Aos meus versos que partem para a humanidade.
E não estou alegre nem triste.
Esse é o destino dos versos.
Escrevi-os e devo mostrá-los a todos
Porque não posso fazer o contrário
Como a flor não pode esconder a cor,
Nem o rio esconder que corre,
Nem a árvore esconder que dá fruto.
Ei-los que vão já longe como que na diligência
E eu sem querer sinto pena
Como uma dor no corpo.
Quem sabe quem os lerá?
Quem sabe a que mãos irão?
Flor, colheu-me o meu destino para os olhos.
Árvores, arrancaram-me os frutos para as bocas.
Rio, o destino da minha água era não ficar em mim.
Submeto-me e sinto-me quase alegre,
Quase alegre como quem se cansa de estar triste.
Ide, ide de mim!
Passa a árvore e fica dispersa pela Natureza.
Murcha a flor e o seu pó dura sempre.
Corre o rio e entra no mar e a sua água é sempre a que foi sua.
Passo e fico, como o Universo."
(Alberto Caeiro)

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

???

Júlia de Oliveira.
Questão: quem foi?

terça-feira, 19 de agosto de 2008

Instante

"Vive o instante que passa. Vive-o intensamente até à última gota de sangue. É um instante banal, nada há nele que o distinga de mil outros instantes vividos. E no entanto ele é o único por ser irrepetível e isso o distingue de qualquer outro. Porque nunca mais ele será o mesmo nem tu que o estás vivendo. Absorve-o todo em ti, impregna-te dele e que ele não seja pois em vão no dar-se-te todo a ti. Olha o sol difícil entre as nuvens, respira à profundidade de ti, ouve o vento. Escuta as vozes longínquas de crianças, o ruído de um motor que passa na estrada, o silêncio que isso envolve e que fica. E pensa-te a ti que disso te apercebes, sê vivo aí, pensa-te vivo aí, sente-te aí. E que nada se perca infinitesimalmente no mundo que vives e na pessoa que és. Assim o dom estúpido e miraculoso da vida não será a estupidez maior de o não teres cumprido integralmente, de o teres desperdiçado numa vida que terá fim."

(Vergílio Ferreira, in 'Conta-Corrente IV')

domingo, 17 de agosto de 2008

O que é que a baiana tem?

"Desde que em 1938 Carmen Miranda cantou 'O Que É Que a Baiana Tem?' que a regra se fixou: a obra de Dorival Caymmi soaria sempre mais familiar na voz dos outros. 120 músicas depois, o génio da música popular brasileira calou-se, mas continua a ouvir-se em toda a parte. Tinha 94 anos " ( in DN)


sábado, 16 de agosto de 2008

P'ra além das ruas

No dia em que Obikwelu não foi apurado para a Final dos 100m e anunciou o fim da sua carreira; no dia em que três homens encapuzados tentaram assaltar à mão armada um feirante de ouro em Ermesinde; no dia em que a volta a Portugal chegou à Torre com um tempo hà muito não visto; no dia em que o mundo continua a acontecer..deixemos um pouco o "nome das ruas a marinar", para ouvirmos uma sra que faz hoje 50 anos, e que diz: "Podemos conseguir fazer o que quisermos!"
Acrescento: Acreditar.Sonhar.Lutar.Perder.Ganhar.Ser.Viver.
Sras e srs, Madonna:

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Augusto Hilário

Augusto Hilário, nascido em Viseu no ano de 1864, foi o cantor que deu ao fado de Coimbra a forma-base que ainda hoje se mantém, o primeiro estilista do género. Estudante de medicina, actor, cultor da boémia e do romance, acompanhava-se à guitarra e escrevia os seus próprios poemas, embora musicasse igualmente contemporâneos seus como Guerra Junqueiro, António Nobre, João de Deus ou Teixeira de Pascoaes. Senhor de uma linda voz, de barítono, segundo uns, de tenor, segundo outros, as suas aparições em público eram sempre aclamadas.
Falecido prematuramente em 1896,ficou imortalizado no célebre Fado Hilário que até Amália gravou. Mas não serão muitos aqueles que identificarão o Fado Hilário com uma pessoa que existiu realmente.





O jornal O Primeiro de Janeiro recorda assim: " O Hylário, o querido boémio das serenatas alegres e doidejantes, improvisou durante o sarau esta quadra (...) e seguidamente ajoelhou e atirou (...) a sua mágica guitarra que ainda vibrava (...). Os espectadores pediram mais trovas".

quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Maria Severa


Maria Severa, nasceu em 1820, no bairro da Madragoa em Lisboa. De beleza exotica e cantar expressivo, conquistou os boémios da capital. Conta-se que levou o fado aos bairros populares de Lisboa e a sua voz animou as noites de muitas tertúlias bairristas; tabernas ficaram famosas só pela sua presença. A sua mocidade cheia de beleza, despertou paixões: diz-se que terão sido os seus olhos aliado ao seu doce canto a atrair o Conde de Vimioso. Mas leviano o Conde deixa a Severa e apaixona-se por uma cigana. Severa fica desvairada e começa a não ter forças para lutar pelo seu amante. Entretanto os sintomas da doença começam a manifestar-se e a 30 de Novembro de 1846 morre pobre e abandonada num miserável bordel da Rua do Capelão, vitima de tuberculose. Consta que as suas últimas palavras terão sido: "Morro, sem nunca ter vivido". Foi sepultada em vala comum, sem caixão, cumprindo o seu desejo.

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Amália Rodrigues

Amália da Piedade Rodrigues, nasceu a 23 de Julho de 1920 de de Dezembro de 1928 nasce numa família pobre e numerosa, que, vinda da Beira Baixa, tentava a sorte na capital. Passado pouco tempo, os pais voltam para a província, e deixam Amália com quatorze meses a viver com os avós maternos.
Estreia-se no Retiro da Severa, em 1939, e este êxito pega como um rastilho e espalha-se por Lisboa .
Em poucos anos, Amália torna-se num símbolo do sucesso nacional: a rapariga pobre que com o poder do seu canto passa da noite para o dia a ser rica e famosa, despertando todas as paixões. Tudo sobre ela se diz, tudo sobre ela se quer saber, todos os amores lhe são atribuídos. À sua volta gera-se uma curiosidade sem precedentes, sendo discutida, criticada, copiada, e seguida com ilimitado fervor.

De triunfo em triunfo Amália faz vibrar os públicos mais diversos. Em 1962 no festival de Edimburho mais uma vez a consideram à altura dos grandes artistas clássicos. Em 1963, em Beirute, é tal o seu prestígio, que a convidam a acompanhar com os seus fados uma Missao de Acção de Graças pela independência do Líbano. E continua sempre a voltar aos países que não se cansam de a reclamar. Em Paris, o acolhimento do público é sempre delirante, não só no Olympia, como participando nos mais sensacionais acontecimentos artísticos.

Em 1989, comemorando os 50 anos de carreira de Amália, a EMI-Valentim de Carvalho edita “Amália 50 anos”, uma colecção de oito duplos-álbuns ou CD´s temáticos agrupando muitas das gravações de Amália para a companhia, entre os quais várias raridades e gravações inéditas.
Amália Rodrigues faleceu no dia 6 de Outubro de 1999.

http://www.youtube.com/watch?v=JRANpTsA5Sw&feature=related

terça-feira, 12 de agosto de 2008

Fernando Farinha

Jardim da Amoreira é um bairro. Com ruas. Uma rua de cada vez.
Comecemos pela "linha da frente": Rua Fernando Farinha.

Fernando Farinha, nasceu a 20 de de Dezembro de 1928 no Barreiro, ainda criança veio residir para Lisboa com os pais. Aos 7 anos já cantava e entrou em vários concursos infantis, teve tanto êxito que passou a ser chamado de "Miúdo da Bica" (bairro onde morava). Entre finais dos anos 60 em diante faz digressões artísticas por todo o mundos, Bélgica, França, Inglaterra, Alemanha, África do Sul, Argentina e E.U.A.
Fernando Farinha faleceu no dia 12 de Fevereiro de 1988.


Deixo-vos, "O rapaz do táxi":

"O jovem chauffer de praça
Dono e senhor da cidade
A buzinar e a refilar por todos passa
Como uma flecha sempre em louca velocidade

Quando apanha um passageiro
Se o serviço não lhe agrada
Torce o nariz, ele aí vai caminho inteiro
Metendo todas as mudanças á pancada

O rapaz do táxi tal como a guiar
Conduz sua vida sem nunca afrouxar...
Tem pé vigoroso, firmeza na mão
Faz frente ao destino sem meter travão...
O rapaz do táxi tem motor no peito
Tanto anda nas curvas como anda a direito...
A vida é malvada e jamais melhora
Se não fôr levada sempre a cem á hora

O jovem chauffer de praça
Mal começa a entardecer
Se fez a folha, já ninguém, ninguém a caça
Até á hora em que o colega o vem render

Ao balcão dum velho bar
Entre um bagaço e um café
Fuma um cigarro e lê a Bola, até chegar
Sua miúda que trabalha ali ao pé"
(
http://jorgesilva.bloguedemusica.com/8097/O-rapaz-do-taxi/ )

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Poema dum funcionário cansado

"A noite trocou-me os sonhos e as mãos
dispersou-me os amigos
tenho o coração confundido e a rua é estreita
estreita em cada passoas casas engolem-nos
sumimo-nos
estou num quarto só num quarto só
com os sonhos trocados
com toda a vida às avessas a arder num quarto só
Sou um funcionário apagado
um funcionário triste
a minha alma não acompanha a minha mão
Débito e Crédito Débito e Crédito
a minha alma não dança com os números
tento escondê-la envergonhado
o chefe apanhou-me com o olho lírico na gaiola do quintal em frente
e debitou-me na minha conta de empregado
Sou um funcionário cansado dum dia exemplar
Por que não me sinto orgulhoso de ter cumprido o meu dever?Por que me sinto irremediavelmente perdido no meu cansaço
Soletro velhas palavras generosas
Flor rapariga amigo menino
irmão beijo namorada
mãe estrela música
São as palavras cruzadas do meu sonho
palavras soterradas na prisão da minha vida
isto todas as noites do mundo numa só noite comprida
num quarto só"
(António Ramos Rosa)

As casas "engolem-nos", mas os sonhos trocados ou nao, existem.

sábado, 9 de agosto de 2008

800 m2




E aqui está ela. Conforme prometido: a praça de 800 m2. Avisto manhãs com pão quentinho à porta. Avisto belos fins de tarde numa esplanada. Avisto passeios em noites de verão.Avisto um bairro a nascer.

quarta-feira, 6 de agosto de 2008

Era assim..


Boa tarde! Em época tipicamente de férias, regresso com uma memória:"era assim",..um pouco da praça que está a surgir.. antes de surgir?! Daqui a alguns dias mostrarei o "está assim". Edtá prometido :)

sábado, 9 de fevereiro de 2008


Quase um ano depois estou de volta, espero.. O Jardim continua a surgir, a nascer.. Este lugar inspira-me. Acho que a nossa casa deve ser dos locais mais importantes para nós, com mais significado, mais nosso, construido e "recheado" por nós e para nós..Sinto a minha casa como o "meu mundo"!..E o que a partir dele a minha vista alcança por esta terra fora ajuda-me a pensar, a ser..a viver?!..Deixo um dos nasceres do dia, um dos momentos que mais me inspira desde que aqui estou. todos os dias.